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Decisão liminar que resultou na derrubada das barracas segue há 15 anos e trava avanços na orla

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Decisão liminar que resultou na derrubada das barracas segue há 15 anos e trava avanços na orla

Em 2010, mais de 300 barracas foram derrubadas após uma decisão liminar do juiz Carlos D’Ávila Teixeira

Decisão liminar que resultou na derrubada das barracas segue há 15 anos e trava avanços na orla

Foto: Metropress/Leonardo Lima

Por: Daniela Gonzalez e Fabiana Lobo no dia 09 de janeiro de 2025 às 08:11

Atualizado: no dia 09 de janeiro de 2025 às 09:33

Matéria publicada originalmente no Jornal Metropole em 9 de janeiro de 2025

Não é de hoje que a orla de Salvador não é mais a mesma, nem para o banhista, nem para o comerciante. Não é de hoje mesmo, o imbróglio das praias soteropolitanas já é quase debutante - ou maior de idade, se quiser entender mais um pouco. Nessa novela (trágica e arrastada, diga-se de passagem), um dos autores que assinam o folhetim é o juiz Carlos D’Ávila Teixeira, da 13ª Vara da Justiça Federal.

Foi ele que, em uma decisão liminar, descreveu as barracas de praia como “favelas na areia” e determinou demolição, classificando a orla da capital baiana como “o mais horrendo e bizarro trecho do litoral das capitais brasileiras”. O resultado? Uma operação que, com tratores, escavadeiras e todo arsenal possível, derrubou 352 barracas de praia. Saiu a “favela” e junto com ela a renda e o lazer de muitos soteropolitanos.

A liminar não teve mérito julgado e permanece há quase 15 anos. Ela atendia a um pedido do Ministério Público Federal (MPF) que alegava que as estruturas estavam distribuídas em terreno da União, mas sequer essa ação foi julgada.

Barracas ao chão

Na manhã de 23 de agosto de 2010, o cenário era de desespero. Barraqueiros e familiares ergueram barricadas, gritaram, choraram e resistiram. Alguns ameaçaram greve de fome; outros preferiram destruir seus próprios estabelecimentos. Nada disso deteve os tratores, que avançaram sob escolta policial. “De 2010 para cá, tivemos uma redução de 90% nas nossas vendas”, relembra Denilson Carvalho, diretor da associação de permissionários, destacando o impacto devastador nas famílias que dependiam da praia.

Só na orla de Patamares, foram 3 mil trabalhadores que ficaram, da noite para o dia, sem emprego. Mas o prejuízo foi muito maior: a morte da cultura da praia, do lazer mais democrático da cidade, sem falar no apagamento do mar paradisíaco de águas mornas da capital.

Os trapalhões

A decisão do juiz pôs fim a uma queda de braço entre a prefeitura (na época comandada por João Henrique) e o Ministério Público, que em 2006 apontou uma série de irregularidades na construção de 50 novas estruturas de alvenaria na areia. O projeto era comandado pelo então secretário de Serviços Públicos, Arnando Lessa, e tinha por trás as cervejarias Ambev e a Schincariol. Foi ali que os últimos dias das barracas de Salvador começaram a ser contados.

O Judiciário embargou as construções, mesmo sob declarações do prefeito, que dizia que as estruturas só seriam destruídas por cima do seu cadáver. As estruturas foram ao chão e, depois dali, os olhos do magistrado voltaram-se para as outras barracas.

Baixa estação

Os barraqueiros que atuavam na faixa de areia tinham autorização da gestão municipal. O juiz, no entanto, considerava que eles estavam ali ilegalmente, pois faltava a anuência do governo federal. Com retórica implacável, ele classificou a orla como “favelizada, imunda, entupida de armações em alvenaria” e determinou a demolição das barracas. A Associação dos Comerciantes em Barracas de Praia chegou a entrar com mandados de segurança contestando a decisão do juiz Carlos D’Avila Teixeira. Ainda assim, a sentença, executada com a força das máquinas, resultou, ao final, na destruição de 447 barracas ao longo dos 64 km de litoral da cidade.

Sob pedra

14 anos se passaram e o processo segue correndo na Justiça. Correndo não, parado, como se uma pedra tivesse sido colocada sobre ele. Sequer muda de instância. Com a proibição de construções na faixa de areia, os banhistas seguem sem banheiro ou qualquer estrutura, com barracas de lona precárias e o pior: sem clientes ou, no máximo, alguns gatos pingados.

“Aqui a gente sofre. Não tem banheiro, não tem policiamento, e os turistas reclamam. É uma vergonha”. O lamento é do comerciante Raimundo Melo. Ele e outros colegas precisam improvisar cozinhas comunitárias fora da faixa, muitos alugam espaços para guardar o material e permanecem sem água ou sistemas adequados de descarte de lixo. Toda essa estrutura exige ainda que eles desembolsem todo mês R$ 319 para atuar na orla.

Expulsos da areia

Desde então, todo projeto que tentou recuperar a orla precisou ser fora da faixa de areia. Um exemplo foram os quiosques lançados em 2015, na gestão de ACM Neto. A proposta fracassou, porque, além da estética “playground de condomínio do Corredor da Vitória”, ela era desconectada do comportamento do soteropolitano nas praias, acostumado a consumir com o pé na areia. Projetos de revitalização tropeçaram entre decisões judiciais e desinteresse, perdem os comerciantes, os banhistas e as cidades.