Jornal Metropole
Home
/
Notícias
/
Jornal da Metropole
/
Desunião no PT baiano e falhas na comunicação marcaram pior resultado da base governista na capital
Jornal Metropole
Desunião no PT baiano e falhas na comunicação marcaram pior resultado da base governista na capital
Com risco de trazer impactos para a eleição de 2026, resultado da disputa pelo Executivo soteropolitano expõe descompasso na base petista
Foto: Divulgação/Ulisses Dumas
Reportagem publicada originalmente no Jornal Metropole em 10 de outubro de 2024
Tinha tudo para dar errado, e foi isso mesmo que aconteceu. Pela primeira vez desde que o PT aplicou um mata-leão no carlismo e assumiu o comando do estado em 2006, um candidato à prefeitura da capital pela base governista termina a disputa na casa dos 10% dos votos válidos. Bom relembrar. O ex-senador Walter Pinheiro teve 41% no segundo turno contra o então prefeito João Henrique em 2008. Na eleição seguinte, o ex-deputado Nelson Pelegrino também perdeu o duelo contra ACM Neto (União Brasil) com 46%. A deputada Alice Portugal (PCdoB) iniciou a descida da ladeira, com 14,5% no passeio de Neto rumo à reeleição. Em 2020, a cúpula petista inventou um quadro de última hora, a Major da PM Denice Santiago, e ela bateu 18,8% no confronto com o prefeito Bruno Reis (União Brasil). Aí vem o grand-finale: o vice-governador Geraldo Jr. (MDB) saiu das urnas com apenas 10,33%, em meio à sequência de tropeços que impuseram ao PT sua maior derrota em Salvador nas últimas duas décadas.
Como não há nada tão ruim que não possa piorar, o nome escolhido pelo partido do governador Jerônimo Rodrigues, com as bênçãos dele mesmo e do senador Jaques Wagner, acabou a corrida em terceiro lugar, ligeiramente abaixo do representante do Psol, Kléber Rosa, que somou 10,43%. Apesar da diferença de somente um décimo, a segunda colocação de Kléber Rosa é a síntese de erros em série cometidos pelo núcleo- -duro da campanha de Geraldo Jr. nessa crônica de uma derrota anunciada.
Grupo racahado
A crônica começa na desunião não só de nomes da base que brigavam para ser o candidato, mas principalmente do próprio do PT. Os líderes Jaques Wagner, Rui Costa e Jerônimo Rodrigues caminharam cada qual para seu lado. O ministro da Casa Civil, então, caminhou para longe da campanha em Salvador. Sua ausência foi uma resposta ressentida por não ter conseguido que seu indicado (José Trindade) fosse o candidato do grupo na capital. Rui só foi aparecer mesmo no dia da votação, quando os três líderes acompanharam o voto do candidato. Mas ali a tragédia já tinha muito mais do que caminho andado e as próprias pesquisas, cujos erros costumam ser lembrados pelos petistas para citar suas vitórias, mostravam isso.
Sequência de erros
Os demais erros agravaram um quadro que já não parecia bom desde a escolha do vice-governador como candidato do Palácio de Ondina. A exemplo do fiasco dos programas eleitorais de rádio e TV e da opção por Geraldo como nome de campanha do emedebista, deixando de lado a forma com a qual ele é popularmente tratado. Ou seja, Geraldinho.
No afã de colar o vice-governador ao presidente Lula e de montar boa parte da estratégia sobre a polarização política que possibilitou a vitória de Jerônimo dois anos atrás, a equipe de marketing e os coordenadores políticos da tropa esqueceram do principal. No caso, combinar antes com o eleitorado tradicional do PT, que olhou para os dois lados e achou Kléber Rosa e também o Psol mais a cara de Lula do que Geraldo Jr. e o MDB.
Embora os principais envolvidos na derrapagem se esforcem para minimizar o mau resultado ou só tratem do assunto na esfera privada, as lideranças da base ouvidas reservadamente pelo Jornal Metropole foram unânimes em apontar a disritmia entre o candidato em Salvador e o grupo ao qual ele representou na sucessão como um dos principais fatores para a derrota do bloco petista na batalha pelo controle da capital. Em linhas gerais, a avaliação média é a de que, dificilmente, um político que há pouquíssimo tempo era linha de frente dos herdeiros do carlismo - portanto, da direita - ganharia corações e mentes dos eleitores que gravitam na órbita da esquerda.
Em entrevista à Rádio Metropole no último domingo (6), logo após a contagem das urnas, o vereador licenciado Henrique Carballal, coordenador-geral da campanha de Geraldo Jr., atirou a derrota nas costas do marketing. “Erramos na comunicação, na forma de apresentar ao povo o que propomos. Precisamos entender que não conseguimos mostrar para o povo que a gestão qualificada que realizamos no governo do estado poderia ser a melhor para Salvador”, disse Carballal, depois de anunciar a decisão de cancelar a coletiva que o vice-governador daria no rastro do resultado e restringir as declarações do emedebista a uma nota à imprensa.
Foto: Divulgação/Ulisses Dumas
Derrota trancada num quarto escuro
Na nota, Geraldo Jr. fez o que pôde para transformar limão em limonada, por meio de um discurso que enxergava vitória onde não havia. “Saímos das eleições ainda mais fortes e unidos para os próximos desafios, que vão exigir coragem, determinação e trabalho, marcas inconfundíveis do nosso grupo político”, afirmou.
O governador foi no mesmo caminho. “Não entendo como derrota de governo. Pra mim, eleição é de quem ganha, quem concorre, quem disputa. Nós fizemos uma eleição disputando Salvador”, disparou Jerônimo, em conversa com jornalistas na tarde de terça-feira.
Já Wagner, patrocinador-mor da candidatura de Geraldo Jr., pegou o bonde para Brasília na madrugada de segunda- -feira (7), trancou a sucessão em Salvador no quarto escuro do silêncio e, até o momento, faz de conta que não teve nada a ver com o peixe, ainda que o fiasco na capital tenha caído também sobre seu colo. E de pouco vai adiantar fingir que não está vendo o pacote, porque a oposição teve particular gosto em apontar o dedo para ele. Por sua vez, Rui Costa, que adotou distância regulamentar da briga, manteve a postura, na tentativa de escapar sem arranhões da crônica, como se não fizesse parte da mesma turma. Melhor fez o senador Otto Alencar (PSD), que preferiu saborear os 115 prefeitos eleitos por seu partido sem estragar a refeição com uma sobremesa indigesta.
“Não posso dizer o que houve em relação ao desempenho da base nas eleições em Salvador. Em 2016, com Alice, também não foi muito bom, assim como em 2020, com a major Denice. Posso dizer somente que, como amigo dele (de Geraldo Jr.), lamento pelo resultado”, sintetizou Otto, em conversa com a reportagem. Mas como todo político de larga quilometragem, o cacique do PSD fez questão de lembrar que, apesar da derrota, Geraldo Jr. é vice- -governador, tem mais dois anos de mandato pela frente e pertence ao MDB. E isso não é coisa pouca no tabuleiro, ainda mais diante de uma disputa que promete tocar fogo no parquinho em 2026.
📲 Clique aqui para fazer parte do novo canal da Metropole no WhatsApp.