
Que jornalismo e para quem
Para se manter em evidência na economia da atenção, o jornalismo de feed remete cada vez menos ao que é notícia, informação e interesse público

Foto: Reprodução
Sete de abril, dia do jornalista. Profissionais reviraram baús digitalizados e compartilharam fotos de décadas anunciando o quanto são felizes pela escolha da profissão certa. É mesmo um privilégio passar a vida e pagar as contas fazendo uma atividade que dá prazer e senso de realização. O problema é a vida e o cenário atrás da fotografia, o diagnóstico pouquíssimo agradável das rotinas e cenários de quem atua hoje na maioria dos veículos de imprensa do país, sobretudo os de menor relevância, que se contorcem todos os dias para atender à logica dos cliques imposta pelo algoritmo e pelas engrenagens de alcance.
Para se manter em evidência na economia da atenção, o jornalismo de feed remete cada vez menos ao que é notícia, informação e interesse público. Praticamente inexiste, na dieta informativa de quem só se informa pelas redes, o interesse publico, enquanto explode em evidência o interesse “do” público. E essa partícula aspeada faz uma diferença abissal na expressão. No fluxo do feed que exibia jornalistas em carrosséis de fotos provando o tamanho do orgulho e da realização profissional, liam-se coisas como “viraliza adestramento de pessoas que se identificam como cães”.
Como ler coisas assim, ser profissional da área e não se perguntar o que querem e o que informam os veículos quando destacam esse tipo de informação, que tipo de público pode gostar de consumir isso e se dá por satisfeito. E esse é apenas um exemplo aleatório. É multo chorume e pouquíssima informação limpa. Vendo tantos depoimentos de jornalistas felizes e, simultaneamente, a tipologia das notícias que os veículos em que trabalham publicam, dá uma curiosidade imensa em saber onde se esconde a razão do orgulho profissional narrado. No salário é que não é.
Namorado de Sandy
O jornalismo, é obvio, não se resume a isso. Mas é inegável que cada vez mais aquele que se faz pertinho da gente se aproxima mais disso do que da função de mediar o debate público, aproximar o cidadão comum da compreensão do mundo e permitir que a audiência e o leitor, ao se informarem, se tornem mais advertidos sobre os aspectos contraditórios da sociedade em que vivem. O público abandona cada vez mais o consumo de informação relevante, e quem deveria produzi-la, empresarialmente, opta sem hesitar pelo like fácil, descartável e vulgar.
O discurso de orgulho e o conteúdo entregue parecem mundos separados. A prática destaca o namorado de Sandy, a diferença de idade entre o viúvo do autor de novelas morto e seu novo marido e o entenda/saiba mais/confira aqui o curso, no fim do mundo, de gente aprendendo a se comportar como pet adestrado. Os verbos? Foram reduzidos a meia dúzia. Sempre que há tiroteio, alguém “se assusta”. Se alguém critica, é obrigatório escrever “detona”, e a diretriz é escrever “esTupr0” e “m0r+e, pois o algoritmo acha melhor. E há quem ache assustador a IA escrevendo notícias. Quem se importa? Cada vez menos gente.
📲 Clique aqui para fazer parte do novo canal da Metropole no WhatsApp.