Brain rot: de ‘quem lê tanta notícia?’ a quem vê tanta besteira?
O termo foi cunhado por Thoreau no livro “Walden”, de 1854, garantindo que, na Inglaterra de então, o apodrecimento das batatas só não era pior que o dos cérebros pátrios
Foto: Reprodução
A Universidade de Oxford escolheu "brain rot" como a palavra do ano de 2024, mediante uma votação com mais de 37 mil participantes. O termo pode ser traduzido, em bom português, como "cérebro podre". E visa representar a sensação que tanta gente tem depois de passar horas e horas rolando as barras infinitas de banalidades das redes sociais. Sabe aqueles vídeos de gatinhos fofos, de biquínis lindos, de dancinhas ridículas, de cacetadas engraçadas e outras lantejoulas do supérfluo mais atraente? Pois é, eles estão entre os principais apodrecedores cerebrais de nosso tempo. De acordo com o Dicionário de Oxford, “brain rot” é “a suposta deterioração do estado mental ou intelectual de uma pessoa, especialmente vista como resultado do consumo excessivo de material (principalmente conteúdo online) considerado trivial ou pouco desafiador”. O termo não é novo, foi cunhado por Thoreau no livro "Walden", de 1854, garantindo que, na Inglaterra de então, o apodrecimento das batatas só não era pior que o dos cérebros pátrios, ávidos por soluções fáceis e simplórias. E note-se que a lâmpada elétrica só viria a existir em 1879 — provando que a internet só potencializou algo que parece fazer parte da manada.
E já que a palavra do ano vem da literatura, não foi por outra razão que o poeta Ezra Pound advertiu que se a linguagem de um povo se atrofia, isso corresponde à falência de seu sistema nervoso e sua consequente destruição. O poeta completou garantindo que um povo que se acostuma à má literatura, ideias banais, linguagem frouxa etc tende a "perder o pulso de seu país e o de si próprio”. No caso atual, com a conexão global, o povo é a humanidade e o país o planeta. Em "Alegria, Alegria", Caetano cantou: "O sol nas bancas de revista / Me enche de alegria e preguiça. / Quem lê tanta notícia?". Dia desses vi, no shopping, um pai sentado ao lado da filha. Ele no celular, ela com um tablet no colo. A menina tinha os dedos grudados por chiclete. Mas o pai não via. Nem ela pedia ajuda, vidrada no vidrinho vendo desenho. Em maior ou menor escala, todos estamos um pouco como essa família. E a extinção virá num download gratuito e bastante colorido.
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