“Meu coração amanheceu pegando fogo”, diz o Brasil

O Brasil tem mania de fogo. Ou, melhor dizendo: o Brasil é fogo! As notícias sobre os incêndios que se alastraram por 48 cidades do estado de São Paulo, o mais rico da união, e a suspeita de que tenham sido criminosamente orquestrados, me lembraram outras ocorrências pirotécnicas que marcam nossa sofrida história. Lembro inclusive a tirada do poeta Capinan que, numa série de shows no Pelourinho, com a extinta banda Confraria da Bazófia, dizia que Nero tinha tudo para ser baiano, por aquele gosto mórbido de tocar fogo nas coisas. Ele listava incêndios suspeitos, supostamente de conveniência, que abriram clareiras para interesses nem sempre confessáveis na cidade do Salvador, como o do Mercado Modelo e o da Feira de Água de Meninos.

O show em questão aconteceu em 1998 e, por isso, Capinan não podia citar o incêndio na Secretária Municipal de Educação de Salvador, em 2013, lembram? Mas, àquela altura e naquele lugar, devia ter mencionado que no próprio Pelourinho, entre os anos 1980 e 90 um grande número de casarões tombados foi consumido pelas chamas que, de acordo com as suspeitas de Clarindo Silva, eram encomendadas por seus proprietários para se livrarem dos trambolhos e construírem edifícios modernos e lucrativos. No caso atual, a própria ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, declarou desconfiar de uma ação semelhante ao “dia do fogo”, quando incêndios florestais foram provocados por criminosos em agosto de 2019 nos municípios de Altamira e Novo Progresso, no Pará.

A motivação para tal ação criminosa, porém, não me parece clara nesse episódio. Enquanto aguardamos as investigações, chama atenção o pendor incendiário do país. A ferro e fogo é uma expressão que significa resolver determinada situação usando a força bruta, a violência. Homem cordial como é o brasileiro, deve recorrer tanto ao artifício acreditando que “amor é fogo que arde sem se ver”.