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Cibercangaço avança no Nordeste

Cibercangaço avança no Nordeste

O Brasil assiste ao avanço do cibercangaço, outra derivação dos modus operandi das facções nacionais do tráfico de drogas

Cibercangaço avança no Nordeste

Foto: Reprodução

Por: Malu Fontes no dia 27 de março de 2025 às 07:07

Nenhum nordestino alfabetizado desconhece o fenômeno do cangaço. Mais recentemente, o termo foi revisitado e acrescido do prefixo ‘neo’ para descrever as invasões violentas de dezenas de criminosos a pequenas cidades do interior do país, principalmente no Nordeste, para assaltos a bancos em que a população e até a polícia é transformada em refém. Com atos de violência brutal, como pessoas amarradas a carros na fuga, o neocangaço se transformou até em série de televisão com amplo sucesso de público. 

Agora, em 2025, o Brasil assiste, com predomínio no Norte e Nordeste, ao avanço do cibercangaço, outra derivação dos modus operandi das facções nacionais do tráfico de drogas. Embora com concentração maior no Ceará e ações em ascensão em Salvador e Belém, o Comando Vermelho vem importando, da região metropolitana do Rio de Janeiro, a incursão nas duas regiões o achaque e a extorsão às empresas de conexão à internet, ameaçando deixar sem serviço as populações dos bairros mais periféricos, onde o interesse das teles de grande porte é pequeno. 

Recentemente a facção destruiu parte da estrutura de conexão à internet na região do Complexo Industrial e Portuário do Pecém, a 60 quilômetros de Fortaleza e onde estão localizadas dezenas de empresas de energia, siderurgia, cimento e logística portuária. O objetivo, dependendo da região onde atacam, é assumir, como fazem hoje as milícias e o tráfico no Rio de Janeiro, a exploração direta da prestação de serviços na área de conexão a internet, ou chantagear o segmento a pagar à facção um percentual fixo do lucro. Quem não paga arcará com prejuízos recorrentes, que vão se repetindo. 

Exclusão e narcoestado

Soldados da facção ou usuários com dívidas são comandados a destruir as estruturas nas ruas, a arrancar as caixas de fibra ótica, sempre com ordens dadas por lideranças de fora do estado onde ocorrem as ações. Quem não cumpre a ordem morre. Quase sempre os executores são presos, mas para cada prisão há dezenas de nomes à disposição para novas ações criminosas. O reparo só é possível de ser feito com escolta policial, pois técnicos são impedidos de ter acesso aos bairros onde os danos são feitos na estrutura de conexão. 

Para as empresas de pequeno porte que atuam nas periferias onde as grandes teles não têm interesse tem sido impossível lidar com novos prejuízos a cada semana, reiteradamente e com o volume crescente de assinantes rescindindo o contrato. Os prejuízos são para todo mundo. Mercadinhos não conseguem operar caixas, cartões de crédito e pix, moradores não têm pacote de dados e se tornam excluídos digitais e a polícia não consegue impedir a ação simultânea em diferentes bairros e com diferentes estratégias. De fenômenos assim vai se construindo o narcoestado.