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Desespero pela hegemonia

Nem o negócio, a comercialização agressiva do carnaval consegue melhorar nossa relação com o patrimônio, transformando o sobrado em camarote chique
Foto: Reprodução
Logo na entrada do Campo Grande, na esquina que divide a praça e o início da rua do Forte de São Pedro, há um sobrado enorme. Embaixo, funcionam uns bares (com todo respeito, pois são meus preferidos) meio fuleirinhos. No andar de cima, nada. Do chão da rua, olhando pelas janelas, podemos ver o céu por falta de teto e outros sinais de degradação evidentes. Situação parecida com a que vitimou o casarão onde funcionava o restaurante Colon, no Comércio. Mas, vou repetir a localização para deixar mais claro o que quero dizer: bem na entrada do Campo Grande, isto é, num dos pontos mais privilegiados do maior Carnaval do Mundo. Aquele mesmo que movimentou, só na edição deste ano, R$ 6,6 bilhões!!!
Agora você veja, se nem o negócio, a comercialização agressiva do carnaval consegue melhorar nossa relação com o patrimônio, transformando o sobrado em camarote chique, por exemplo, como seria em qualquer nação capitalista dos infernos, o que temos aqui é realmente capitalismo? Na minha ignorante opinião, não. Estamos até hoje num estado pré-capitalismo selvagem, onde só o selvagem se aplica. Reforço, a queixa deveria ser que transformaram tudo em camarotes, que o povo já não tem mais espaço para brincar, que os preços são abusivos etc etc etc, mas com o edifício mantido em excelente estado por essa mesma lógica. Não. O que temos na prática são todos os efeitos colaterais, e ainda por cima o casarão ameaçando cair na cabeça de Ivete ou de Bell Marques e mais 700 foliões se bater um vento danado no dia.
Há alguns anos, o filósofo Roberto Mangabeira Unger vem falando em “impor o capitalismo aos capitalistas” no Brasil. É preciso ouvir bem essas palavras. Capitalismo, na letra (e na prática, em países desenvolvidos) exige concorrência desenfreada que se vence à base do melhor desempenho, da maior competência. E não é assim que nossa banda toca. Aqui, a maior parte das grandes fortunas se mantém na base do clientelismo com a verba pública. Inclusive no (não) pagar dos impostos. Saber fazer tráfico de influência é muito mais importante do que ter que entregar um produto ou serviço de excelência. Forçar o consumo não é tanto a fórmula quanto ter um funcionário fazendo o trabalho de três e ganhando por meio. Repito: ainda não chegamos sequer ao capitalismo, que em si não é nenhum doce de coco. Só ficamos com o diabo e suas diabetes!
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