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Fábrica de robôs: Padronização de livros didáticos coloca em xeque identidade e criticidade dos alunos

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Fábrica de robôs: Padronização de livros didáticos coloca em xeque identidade e criticidade dos alunos

O Sindicato dos Professores no Estado da Bahia (Sinpro) denunciou a perda progressiva de autonomia dos professores na sala de aula.

Fábrica de robôs: Padronização de livros didáticos coloca em xeque identidade e criticidade dos alunos

Foto: Acervo pessoal

Por: Luanda Costa no dia 20 de fevereiro de 2025 às 07:10

Atualizado: no dia 20 de fevereiro de 2025 às 10:23

Matéria publicada originalmente no Jornal Metropole em 20 de fevereiro de 2025

Quem dera o esquema de venda de livros e materiais didáticos fosse o único problema enfrentado por pais e alunos de colégios particulares de Salvador. É só mais um dos grãos na venda a granel que se tornou a educação. Junto com a “venda casada” de kits escolares a preços exorbitantes e a pressão para a compra, vem também no combo deste modelo a padronização dos conteúdos e a perda da autonomia dos professores dentro e fora das salas de aula.

Padronização dos conteúdos é uma forma delicada de citar a massificação e homogeneização do material didático distribuído ou ainda a robotização dos estudantes. Nada de detalhes da geografia baiana ou da história da Independência do Brasil na Bahia. São páginas e mais páginas sobre os entraves e bandeirantes do sudeste, a imigração no sul, enquanto os conflitos locais, quando citados, são dados apenas como uma “nota de rodapé”. Ao aluno, resta a perda de criticidade e de conhecimento da própria história.

Missão padronizar, massificar e alienar

Mãe de um aluno do Colégio São Paulo, Jussara Fernandes detalhou o cenário. “Não existe uma especificação, por exemplo, para alunos da Bahia sobre a revolta baiana que ajudou a Independência do Brasil, não é um livro trabalhado pelo regionalismo. A plataforma é única, vendida para o Brasil inteiro, não há uma formatação aqui no Nordeste para dar prioridade ao estudo das regiões climáticas nordestinas, do folclore. É uma forma de fazer todo mundo igual, é a homogeneização, a escola sem escola”, lamentou em entrevista à Rádio Metropole.

Os livros adotados para o filho dela são os mesmos indicados para estudantes de um colégio brasiliense da mesma rede, que recebeu um investimento de R$ 1 bilhão de um fundo americano e comprou os colégios São Paulo, Portinari e Anchieta. A única diferença entre Brasília e Salvador é que, enquanto aqui o kit é vendido por cerca de R$ 4 mil, lá é quase metade do preço.

Estoque de robôs

A “fábrica de robô” não para por aí. Outra mãe do Colégio São Paulo, Nívia Carvalho revelou também que até os professores são pressionados a não utilizar matérias complementares ao conteúdo do “kit nacional”.

Quartel didático

Figura fundamental na educação, os professores se tornaram mais uma vítima desse modelo mercantil. A constatação é do próprio Sindicato dos Professores no Estado da Bahia (Sinpro) e seu presidente, Allyson Mustafa, que denunciou a perda progressiva de autonomia dos professores na sala de aula.

É uma espécie de “quartel didático”, onde as instituições vendem não apenas livros, mas sim um pacote fechado e massificado de Ensino. “Há uma diretriz que estabelece que o professor precisa participar da escolha do material didático, mas tem sido violada pelos donos de escola. O professor não participa mais. É uma questão meramente comercial em que os donos de escola estabelecem qual será o material didático e o empurram goela abaixo de pais e professores”, denunciou. 

Mercado de aulas

Professor e mestre em educação, Nelson Pretto vê com preocupação essa maneira massificada e centralizada de fornecer conteúdo para os alunos e ainda de cobrar preços exorbitantes pelo material. A esse combo de práticas, ele atribui o termo “colonização da educação”.

“Nós não estamos mais falando em educação, nós estamos falando em empresas. A educação virou mercadoria. O professor virou um mero repassador de informações, um ator que de uma peça que é escrita pelas matrizes das empresas donas desses colégios”, analisou.