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'Há mulheres que são operadoras do patriarcado', avalia Débora Diniz

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'Há mulheres que são operadoras do patriarcado', avalia Débora Diniz

Antropóloga avalia qual o impacto das políticas e das bandeiras morais defendidas pelo atual governo

'Há mulheres que são operadoras do patriarcado', avalia Débora Diniz

Foto: Metropress

Por: Matheus Simoni no dia 20 de agosto de 2020 às 14:55

Antropóloga, professora e pesquisadora, Débora Diniz comentou o caso envolvendo a menina de 10 anos que engravidou após ser violentada por um tio em São Mateus, no Espírito Santo. Ela fez um procedimento de aborto nesta semana, em Recife, após a equipe médica local se negar a fazer a intervenção na cidade capixaba onde vive, mesmo com aval da Justiça. Houve protesto de grupos de religiosos contrários ao aborto, mas sem a mesma veemência para cobrar investigações sobre o então paradeiro do tio acusado de cometer o crime, que já foi preso.

Para Débora Diniz, há indícios de que os posicionamentos de fanáticos religiosos tenham respaldo de membros do governo de Jair Bolsonaro, como a ministra Damares Alves, chefe da pasta da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. 

"Tivemos indivíduos que assumiram suas posições de poder com uma voz valente e de respeito inclusive a essa multidão de fanáticos que estavam ali", diz a antropóloga, em entrevista à Rádio Metrópole hoje (20), durante o Jornal da Metrópole no Ar. Ela reforça o papel de um grupo de mulheres que se manifestou em defesa da menina em frente ao hospital onde ela estava internada.

"O fato que, paralela à tentativa de invasão dos hospital, tivemos algumas dezenas de mulheres anônimas para a porta do hospital, de máscara e durante uma pandemia, para tentar conversar com os fanáticos. Eu diria que há esperança na sociedade brasileira, não só na política. Nesse tema, não podemos nos enganar, é fundamental ao bolsonarismo. Não foi nos 18 primeiros meses do governo porque eles tiveram problemas muito maiores do que sua bandeira moral", declaro.

Ainda de acordo com a pesquisadora, o papel da mulher em situações como essa não garante um "clique de clarividência" contra o patriarcado. Sem citar o nome a extremista Sara Geromini, que divulgou na internet informações da localização da jovem e incentivou protestos contra o aborto, Débora revelou que foi alvo de fake new envolvendo o caso.

"Há mulheres que são, ministra Damares é um exemplo, operadores do patriarcado. Essa moça que não vou nomear, a qual abri um processo contra ela e não irei nomeá-la, porque nesse vídeo ela atribui a mim poderes soberanos de tão longe, em outro país, ser quem está movimentando a menina de um estado para outro. Ontem, [houve] uma difamação ainda maior, alegando que eu havia disseminado imagens da menina. Eu deveria ter poderes sobrenaturais para fazer isso tudo estando de tão longe. Mas essa é uma das lógicas do bolsonarismo, operar pelo medo, mentira e difamação", disse Diniz. 

A antropóloga também comentou a omissão da equipe médica do Programa de Atendimento as Vítimas de Violência Sexual (Pavivi), que atuou no Hospital Universitário Cassiano Antonio Moraes (Hucam), em Vitória, onde a criança foi internada. A gestação resultante do estupro, de pouco mais de vinte semanas, ainda contou com autorização do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJ-ES), mas mesmo assim não foi obedecida. 

"Não existe recusa de consciência, e a palavra que temos que falar é recusa, desse grupo de médicos. De um estado de um serviço e dizer 'eu não faço'. E nós vivemos em uma democracia tão protetora das crenças das elites e dos que estão no poder que nós não perguntamos o poder de justificação dessas crenças. Se você diz que a sua crença não me permite fazer aborto desta menina, isso está na fronteira da discriminação e omissão de socorro", disse Débora Diniz. 

"Aqui a resposta não é jurídica. Pode ser até na interpelação a esses médicos, mas ela é uma resposta humanitária. Quem são esses covardes que abandonam uma menina de 10 anos a uma situação de risco de morte? Quem são esses covardes que têm medo de um efeito de ódio de rebanho e não fazem uma prática cotidiana que tem que ser uma prática básica da medicina, que é cuidar?", questiona a antropóloga.