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Símbolo da importância da Praça Municipal para a cidade, Palácio Thomé de Souza enfrenta espécie de déjà-vu
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Eleição de 1985 ajuda a explicar: por que Salvador, a cidade mais negra fora da África, nunca elegeu um prefeito negro?
Na bancada da Metropole, ao lado de Edvaldo Brito e Mário Kertész, o cientista político Cloves Luiz Pereira discutiu o enigma da capital baiana nunca ter elegido um prefeito negro
Foto: Reprodução
Matéria publicada originalmente no Jornal Metropole em 06 de fevereiro de 2025
A Roma Negra, a capital afro ou simplesmente a cidade mais negra fora da África. Essa é Salvador, o município que carrega o marco de nunca ter elegido um prefeito negro. O que explica o enigma? Ensaios sobre essa resposta foram elaborados nos estudos do professor e cientista político Cloves Luiz Pereira.
O objeto desse estudo foi a corrida pela prefeitura de Salvador em 1985, que trouxe não só o primeiro prefeito eleito democraticamente após 21 de Ditadura Militar, mas também o primeiro embate birracial pela gestão da cidade. Entre os mais bem posicionados, estavam, de um lado Edvaldo Brito, e do outro, Mário Kertész, que saiu vitorioso com quase 62% dos votos.
Na bancada da Metropole, ao lado dos dois candidatos da época, Cloves discutiu a eleição e o enigma soteropolitano. Para começar, ele lembrou que a Ciência Política ajuda a interpretar resultados eleitorais com variáveis que influenciam, como o recrutamento dos partidos, que nesse caso era favorável a MK. Ele liderava a coligação “Salvador vai mudar” com os partidos PDT e PSB. Mas a conjuntura do momento é que foi fundamental. Naquele período, lembra o professor, havia uma mobilização para a redemocratização e a insurgência contra os grupos aliados à Ditadura Militar.
Sede por transformação
“É difícil remar contra uma conjuntura na qual o que se quer é um novo. E todos aqueles que associaram sua imagem com uma coisa que não significava uma transformação acabaram tendo dificuldade de sensibilizar o eleitorado. No caso, o candidato que mais conseguiu sintonizar com essa proposta foi o ex-prefeito Mário Kertész”, explicou o professor. MK concordou com a análise de Cloves. Mas, para ele, sua vitória foi também resultado de uma onda. “Acho que acabei atropelando, primeiro internamente, os candidatos do PMDB. E nessa mesma onda, ganhei a eleição. É claro, muito em função do trabalho que eu fiz como prefeito biônico, mas também do momento que provoquei minha demissão e desafiei Antônio Carlos Magalhães”, afirmou, reconhecendo que uma vitória de Edvaldo teria significado um rompimento com amarras resistentes até hoje.
Negro não vota em negro
Mas aliado a tudo isso, à campanha do famoso jingle “Deixa o coração mandar” e aos 27 minutos de programa eleitoral que tinha MK, Edvaldo esbarrou também no tal enigma da Roma Negra. Ele lembrou que um secretário de sua equipe, ao apresentar o santinho de Edvaldo a uma funcionária, ouviu dela: “não voto, não. Ele é neguinho como eu, que diabo ele vai fazer? Não sabe nada”.
Há, não só naquele período, mas também hoje, ideias e preconceitos que limitam o avanço dessas candidaturas representativas, mesmo em cenários onde se cobra a emergência dos negros na política. “É um preconceito internalizado, inclusive entre os próprios negros. A velha máxima de que ‘trabalhador não vota em trabalhador’, ‘negro não vota em negro’ e ‘mulher não vota em mulher’ ainda persiste nas eleições”, explicou Cloves. A explicação para essa persistência quem trouxe foi o próprio Edvaldo Brito: é a educação que não tem e dificuldade de ir na raiz para mudar esse enigma.
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