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Revolta dos Malês: 190 anos do grito de resistência que ainda ecoa em Salvador

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Revolta dos Malês: 190 anos do grito de resistência que ainda ecoa em Salvador

Estima-se que 600 escravizados, número expressivo para a Salvador da época, mobilizaram e se rebelaram contra a imposição do catolicismo e da escravidão

Revolta dos Malês: 190 anos do grito de resistência que ainda ecoa em Salvador

Foto: Reprodução

Por: Ismael Encarnação no dia 24 de janeiro de 2025 às 10:37

Há exatos 190 anos, a Revolta dos Malês marcou Salvador em um dos episódios mais emblemáticos e silenciados da Bahia. Os Malês, escravizados muçulmanos que falavam árabe, liam o Alcorão e dominavam ofícios especializados, não se contentaram com o papel que a elite escravocrata queria lhes impor. Articulados, questionadores e, acima de tudo, ousados, se levantaram contra o sistema escravagista em 1835. Uma história que mal aparece nos livros escolares, mas permanece gravada nos becos, ladeiras e cada pedra que contitui Salvador.

Estima-se que 600 escravizados, número expressivo para a Salvador da época, mobilizaram e se rebelaram contra a imposição do catolicismo e da escravidão. Eles queriam sair do bairro da Vitória e seguir até Itapagipe, tomando engenhos e libertando outras pessoas escravizadas. Apesar da coragem e mobilização, a revolta, que hoje é conhecida como a mais importante rebelião urbana de escravizados do Brasil, acabou sendo sufocada. 

A malandragem mais antiga

Historiadores contam que, armados de paus e lanças, os malês enfrentaram mais de três horas de luta contra civis e soldados coloniais. Ao tentar negociar uma rendição com a elite branca da época, deram de cara com a velha malandragem institucionalizada: a palavra dada pelos opressores não passava de uma falácia. Subiram o morro da Barra, confiando na palavra, com o objetivo de firmar o acordo, e desceram direto para o massacre, vítimas da traição.

Com valores estabelecidos, os Malês não esperavam pelo golpe que lhes foi dado. Afinal, acreditavam na palavra e, para eles, palavra é palavra. Quando é dada, então, um compromisso tem que ser cumprido, acreditavam. A brutalidade que se seguiu foi um recado: "aqui, só reina quem domina". Os líderes foram capturados e severamente punidos para servir como exemplo. 

O simbolismo que fica

Mas, mesmo diante do extermínio, o grito dos Malês não foi apagado. A Revolta é um símbolo da resistência negra, da luta por dignidade e liberdade. É também um lembrete cruel de como as engrenagens da opressão funcionaram e continuam a girar. Os livros de história ignoram — afinal, foram escritos pelos herdeiros de quem venceu à base de aço e pólvora.