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Segunda-feira, 25 de novembro de 2024

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Saiba quem foi Popó, o outro fundador do Ilê Aiyê, bloco que comemora 50 anos em 2024

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Saiba quem foi Popó, o outro fundador do Ilê Aiyê, bloco que comemora 50 anos em 2024

Apolônio de Jesus Filho esteve ao lado de Vovô na criação do bloco que modificou o Carnaval de Salvador

Saiba quem foi Popó, o outro fundador do Ilê Aiyê, bloco que comemora 50 anos em 2024

Foto: James Martins / Metropress

Por: James Martins no dia 20 de dezembro de 2023 às 11:37

Atualizado: no dia 20 de dezembro de 2023 às 14:47

No dia 1° de novembro de 2024, o Ilê Aiyê fará 50 anos. Quando o bloco afro pioneiro completou 18, em 1992, uma música comemorativa estourou nas rádios de todo o país, na voz de Daniela Mercury: “Dezoito anos de glória não são dezoito dias / Nessa linda trajetória no carnaval da Bahia”, diz um trecho da letra de Adailton Poesia e Valter Farias. Naquele mesmo ano, também em novembro, com apenas 40 anos de idade, morria Apolônio Souza de Jesus Filho, o Popó — o outro fundador do Ilê.

Apesar de hoje (desde 2020) estar homenageado e eternizado com um busto no largo do Curuzu, Popó do Ilê não costuma ser muito lembrado e tornou-se uma figura um tanto obscura na história recente do carnaval baiano. Sua importância, no entanto, é indiscutível, dada a relevância do próprio Ilê e tudo o que o bloco modificou no panorama racial brasileiro, não apenas no carnaval. “Era um cara super gente boa”, descreve com simplicidade a cozinheira Andreia Silva, foliã fiel do Ilê Aiyê há décadas.

"A perda de Apolônio se dá num momento em que o quadro da mobilização não está se renovando", disse Vovô, no sepultamento do amigo, na Quinta dos Lázaros, em 16 de novembro de 1992, apenas quatro dias antes da Consciência Negra daquele ano. A militância Popó herdou do pai, de quem também ganhou o nome. O velho Apolônio era estivador, sindicalista, colaborador do jornal comunista O Momento. O filho estudou na Escola Parque da Caixa D’Água, junto com Vovô, ambos moradores do Curuzu.


Infelizmente nunca encontramos o Memorial Popó aberto, nem sequer um perfil em rede social. 

Popó nasceu no dia 18 de agosto de 1952, sob o signo de leão. Tinha, portanto, 22 anos quando fundou o Ilê Aiyê junto com Vovô e uma moçada que envolvia figuras como Jailson, Hildelice, Dete, Vivaldo, Macalé e outros. Técnico em mecânica, trabalhava no Pólo Petroquímico de Camaçari, mas gostava mesmo era de organizar excursões, passeios pelo litoral baiano, com a turma auto-batizada de A Zorra. Segundo Vovô, foi essa turma quem popularizou a praia de Jauá. Pode-se dizer que da confluência de dois grupos, A Zorra e a Turma do Brau (mais focada em bailes que em passeios), saiu o núcleo que criou o primeiro bloco afro.          

Como folião, Apolônio saía no Apaches do Tororó, bloco de índio, antes do nascimento do Ilê. Era também músico e compositor. Para o Ilê Aiyê, deixou uma canção super marcante, gravada inclusive no primeiro disco do bloco “Canto Negro” (1984): o título é “Mãe Preta”, em parceria com Jailson. Essa música, especialmente sua parte em iorubá, costuma ser entoada à capela pelos membros da diretoria do bloco no momento da soltura dos pombos, durante o ritual da saída no Curuzu, sábado de carnaval.

Popó foi o primeiro presidente do Ilê. Mas rompeu e deixou o bloco ainda nos anos 1970. Depois disso, fundou o Afoxé Orumilá, no bairro da Santa Mônica, e também o Afoxé Oju Obá. "Partidário de ideias polêmicas entre as entidades negras, defendia uma luta direta, objetiva e prática na preservação da cultura negra", disse dele Gilberto Leal, coordenador  do Núcleo Cultural Nìger Okàn, na ocasião da morte.

Nove anos antes, foi citado pelo então deputado federal Abdias Nascimento, em pleno plenário da Assembleia Legislativa, após ter sido preso e espancado injustamente, no dia 7 de setembro de 1983, por organizar a Lavagem do Quilombo do Orunmilá. “Os negros foram violentamente agredidos pela polícia militar daquele Estado e, sem nenhuma razão, sem nenhum fundamento foram presos os meus irmãos de raça Apolônio de Jesus, Lino de Almeida e Freitas”, bradou o parlamentar, concluindo haver cumplicidade na injustiça dado o “silêncio dessa 'legítima representante' do povo baiano” diante do ocorrido.

Apolônio de Jesus morreu no Hospital Geral do Estado, após 14 dias internado por conta de duas cirurgias seguidas de apendicite. No velório, conseguiu realizar o que tanto sonhou em vida: reunir todas (ou quase todas ) as entidades negras vigentes, como MNU (Movimento Negro Unificado), Unegro, Olodum, Níger Okàn e, é claro, o Ilê Aiyê. Deixou três filhos: Sidnei Clayton (grande jogador de bola, hoje pastor evangélico), Akono Foluke e Apoene Mandela.


Cópia da oração recitada no velório de Apolônio.